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Como liderar Equipes e Famílias durante o Isolamento Social

Difícil falar de tempo sem falar de espaço. Muitas vezes, prestamos pouco atenção ao espaço e damos grande importância ao tempo. Mas, nesse momento, somos obrigados a nos ater aos espaços. Principalmente, ao espaço de casa para quem está em isolamento social. Não ocupamos mais os locais que nos eram tão habituais.

O confinamento a um espaço nos reajusta à outra noção de tempo. Nunca habitamos nossa casa com o tempo que estamos habitando.

Perdemos nosso antigo mundo e estamos num processo de “desenraizamento” – não sabemos ao certo como será nosso futuro. Tiramos o pé de um lugar relativamente seguro – no sentido de já conhecido e habitado – para outro incerto, a ser ainda construído.

Temos medos desconhecidos que não estão não estão diretamente relacionadas à pandemia, mas são evocados pelos perigos que vivemos ao longa vida. Se pensarmos em nossa antropologia e até em condições da existência,  seres maiores do que nós, anteriores, como os dinossauros foram destituídos da terra e estamos começamos a entender que também poderemos passar por isso. Precisamos de muito cuidado, precisamos estar mais atentos e usar a inteligência, que tanto desenvolvemos ao longo de nossa sobrevivência, a nosso favor.

Nesse momento, há uma gama de reações das pessoas. Algumas, por exemplo, tendo muitos pesadelos, outras sem conseguir dormir. Tenho percebido muito cansaço em função da sobrecarga de trabalhos profissionais e domésticos, problemas nas rotinas com os filhos, etc. Agora, tenho percebido com alguma constância um aumento muito grande no sensorial, sendo que tal aumento pode gerar uma “Inundação” de sensações, pois a percepção do mundo externo está diminuída.

E aqui pode estar uma âncora para pensar a liderança. O líder deve ficar atento se alguém em sua equipe está inundado. Por exemplo, há equipes que estão trabalhando em casa e alguns membros não querem ser vistos pelas reuniões on-line, alegando que “não estão bem”, porque” não arrumaram os cabelos”, estão mal vestidos, etc. Nesses casos, o líder pode incentivar as pessoas a se organizarem para não ficarem na solidão, que é em si desorganizadora, pois impede que experimentemos nosso potencial. Já os encontros nos potencializam, nos capacitam, nos acolhem. Então, eu sugiro que os líderes chamem as pessoas em grupo para se verem, também chamarem-nas no individual se houver necessidade; promovam reuniões com microfones e vídeos ora “abertos”, ora fechados, mas ajudem em alguma plasticidade e constância de encontros.

O líder deve ajudar as pessoas a fazerem a transição do núcleo sensorial para o muscular. Isso nada mais é do que chama-las, convocá-las, promover a aproximação.  Perceber quem precisa de algum apoio.

O risco de se estar muito no sensorial é a regressão a um lugar mais imaturo, de se ver inundado por medos, pensamentos, devaneios. Ao ver o outro, as pessoas podem se reorganizar melhor, ir mais para ação e ter parâmetros de si mesmas, percebendo-se e saindo, se possível, de seus labirintos.

O líder deve, portanto, ajudar sua equipe a não colapsar. Por mais que isso exija uma atenção que pode se tornar cansativa, esse é o caminho mais eficaz para este momento.

Momentos de suplementos e de amparo.

A liderança pode ser pensada como suplemento e amparo, dando recursos para quem ainda não os tem, para quem precisa receber nutrição. O que alimentava sua equipe, não alimenta mais. O líder precisa de ferramentas diagnósticas para ver se as pessoas estão bem “alimentadas”. Deve se perguntar: o que eu posso fazer para somar?

Temos células primitivas e sem nutrição, que temos que cuidar para  fortalecê-las. Nesse momento, esta desnutrição nos custa muito caro e pode tornar as situações ainda mais difíceis.

Tenho notícias de empresas que aumentaram seus faturamentos, e outras com muitos problemas de equipe em home office que não consegue produzir. Há muitas variáveis e precisamos pensar no mundo de hoje a partir dessa ideia que nosso conceito de mundo que mudou.

A mudança do mundo se efetiva nas possibilidades do agora, que, para mim, representam a cura da oralidade. Estarmos isolados, tendo que operar tudo por nós mesmos, aprender a lidar com nossas demandas sem esperar que o outro venha nos salvar, acolher, nutrir. Não podemos dividir nossas responsabilidades com o mundo lá fora. Somos obrigados a nos responsabilizar. Há uma convocação para o fim da vitimização, para acudirmos nossas próprias necessidades sem esperar do outro. Ou seja, é um convite para o amadurecimento.

Em termos de país, por exemplo, somos muito amorosos, mas imaturos. Esperamos muito de nossos líderes, do estrangeiro e pouco nos apropriamos de nossas questões.

Temos que nos despedir do desejo de que alguém venha cuidar de nossa “criança desamparada” e ao nos tornarmos nosso próprio amparo e cuidarmos verdadeiramente de nossa vida, experimentamos nossa real potência e isso pode ser transformador.

Enquanto líderes, precisamos tomar cuidado com o sonho de que nossas equipes farão tudo por nós. Isso é um sonho imaturo, mesmo que a equipe faça tudo muito bem, é preciso reconhece-la, é preciso iluminá-la.

Assim, esse é o momento para pensarmos no individual e na liderança:

O que podemos fazer de autoral?

Como o mundo pode contar comigo?

O que eu quero para daqui cinco anos?

Quero que o mundo me veja sem mascaras, como eu sou, quem eu sou?

Mas, não confundamos: a potência real que devemos experimentar e que  líder deve incentivar não é de ser o máximo, de se fazer o trabalho perfeito, de se ter o casamento perfeito, mas de ser real e de se estar satisfeito com isso. A potência real às vezes pode nos surpreender, porque andou muito tempo escondida pela lamuria e vitimização. Mesmo que seja tentador e lugar comum – até pela nossa constituição cultural – esse é um lugar que não nos dignifica de fato.

Experimentar a verdadeira potência, nos fortalece, nos sustenta – esse é o caminho do líder. Deixo, aqui, a questão: Como uma empresa elabora isso com os seus funcionários?

Numa equipe, todos possuem algum tipo de liderança; todos sabem de algo e podem contribuir. O líder não deve temer isso, mas ajudar a brotar, dar espaço para que isso se expresse.

Não gosto exatamente da palavra “motivação” tal qual é empregada hoje, mas eu a entendo como ajudar a pessoa a ficar autoral e potente – dar tempo e espaço para a potência do outro surgir, aparecer, aí, sim, o líder terá alguém potente com quem contar. E, apesar de parecer o contrário, esse, por tudo que foi dito, pode ser o momento propício para o nascimento dessas expressões de lideranças.

Do outro lado, o líder deve aprender a reconhecer e respeitar a potência do outro. Líderes que gostam apenas dos obedientes podem prestar algum desserviço para sua equipe. Quem é muito obediente pode não atrapalhar, mas por não “habitar” sua força realmente, ele não promove progressos.

Para liderança familiar, os pais não devem se desesperar, pois a criança vive dobrado tudo aquilo que o adulto passa. Os pais também devem deixar surgir seus pequenos líderes, dando autonomia e voz de acordo com as possibilidades de cada um – sem exigir demais, sem cercear demais, deixando o filho ser potente naquilo que ele pode ser.

Os profissionais que estão no “front”

            Falar dos profissionais de saúde que estão na linha de frente do combate à pandemia, neste momento, me faz lembrar da famosa obra de Erich Maria Remarque, “Nada de novo no front”, que conta um pouco do que u aconteceu com as pessoas que foram para a primeira guerra mundial: a oscilação entre a apatia e o desespero.

Esses dois elementos podem ser aspectos apresentados pelo profissionais da saúde e demais que estão vivendo, vendo situações muito difíceis. A preocupação é com o momento atual e com o posterior. A falta de elaboração das pessoas na primeira guerra mundial, como nos conta a obra de Remarque, talvez, tenha resultado na segunda guerra mundial. Quando não elaboramos, repetimos a situação por pior que sejam para podermos elaborar, assim fala a psicanálise.

Então, recomendo: elaborar para não repetir. As pessoas que estão no front – os grupos de saúde dos hospitais – precisaram de apoio para não entrar em desespero, precisam de espaços de cuidados, para que não precisem ser medicadas.

O sofrimento tem que ser elaborado, simbolizado, chorado, depois que a gente chora é um grande alívio e nos cura, nos fortalece, nos deixa mais “imunizados” para a reedição do trauma.

Lembrando que falar de humano é falar de coração e intestino, órgãos que “precisam descarregar”; precisamos saber como e onde descarregar para limpar nossas angústias.

Palavras finais para um novo começo

Percebo um desespero para que voltemos logo às nossas antigas atividades, mas tenho uma notícia: talvez, as coisas não voltem do ponto onde pararam. Estamos vivendo um colapso e não podemos tratar o mundo com os mesmos pensamentos e posturas que produziram o que estamos vivendo. Repensemos para que não voltemos a produzir ou sermos corresponsáveis por colapsos.

Todos temos contribuições p. este mundo – mesmo que sejamos apenas gostas d’água.

Podemos também descobrir qual foi nossa contribuição para essa situação, que não seja sobre a pandemia em si, mas para vivê-la da forma como se está vivendo. O que falta? Como podemos complementar? É hora de estarmos interessados, vivos e criativos

A “Baixa imunidade” da qual tanto se fala tem a ver com a “baixa humanidade”; tivemos, no final das contas, um colapso de baixa humanidade

Por tudo isso, vamos devagar, vamos ter uma pressa bem lenta, correr bem devagar.

Que o trabalho a distância possa ser “vivo” e presente. Nossa força precisa se manifestar em forma e vigor.

Henri Bergson fala que a vida é um passo para trás e dois para frente e, pensar que muita gente só sapateia; numa vida saudável a gente vai para trás para se avaliar, dá um passo para trás para se redirecionar para , aí, sim, poder dar dois passos para frente

Susana Z Scotton

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